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Marte tem um núcleo sólido, resolvendo um mistério planetário de longa data, segundo novo estudo.

Cientistas descobriram que Marte possui uma estrutura interna semelhante à da Terra. Resultados da missão InSight da NASA sugerem que o planeta vermelho tem um núcleo interno sólido rodeado por um núcleo externo líquido, o que pode potencialmente solucionar uma dúvida de longa data.


Notícia

Por Kevin Olsen, Mhairi Reid, The Conversation

Editado por Lisa Lock, revisado por Robert Egan

Traduzido por Marco Centurion


As descobertas, publicadas na Nature, têm importantes implicações para nossa compreensão de como Marte evoluiu. Bilhões de anos atrás, o planeta pode ter tido uma atmosfera mais espessa que permitia a presença de água líquida em sua superfície. O artigo original da Nature pode ser lido aqui.


O planeta Marte (Créditos da imagem: NASA)
O planeta Marte (Créditos da imagem: NASA)

Essa atmosfera mais espessa pode ter sido mantida no lugar por um campo magnético protetor, como o da Terra. No entanto, Marte não possui tal campo atualmente. Cientistas se perguntam se a perda desse campo magnético teria levado o planeta vermelho a perder sua atmosfera para o espaço ao longo do tempo, tornando-se o deserto frio e seco que conhecemos hoje.


Uma propriedade essencial da Terra é que seu núcleo possui um centro sólido e uma camada externa líquida. A convecção dentro dessa camada líquida cria um dínamo, produzindo o campo magnético. Esse campo desvia partículas carregadas ejetadas pelo Sol, impedindo que elas retirem a atmosfera terrestre ao longo do tempo e possibilitando as condições habitáveis que conhecemos.


A partir da magnetização residual na crosta, acredita-se que Marte já teve um campo magnético, possivelmente oriundo de uma estrutura de núcleo semelhante à da Terra. Porém, cientistas pensam que o núcleo deve ter esfriado e parado de se mover em algum ponto de sua história.


Na superfície de Marte, há uma enorme quantidade de evidências de que a água líquida já fluiu, sugerindo condições mais hospitaleiras no passado. Essas evidências aparecem de várias formas, incluindo leitos secos de lagos com minerais que se formaram debaixo d’água, ou as dramáticas redes de vales escavadas por rios e riachos. Contudo, hoje a atmosfera marciana é fina e a quantidade necessária de água não é encontrada.


Equipes que trabalharam com os sismômetros da sonda InSight, da NASA, primeiro identificaram o núcleo marciano e determinaram que ele ainda era líquido. Agora, novos resultados de Huixing Bi, da Universidade de Ciência e Tecnologia da China, em Hefei, e colegas mostram que pode haver também uma camada sólida dentro do núcleo líquido.


A natureza da estrutura interna de Marte sempre foi um mistério intrigante. Ela já foi parecida com a da Terra, com uma camada líquida dinâmica em torno de um centro sólido? Ou o tamanho reduzido de Marte teria impedido essa formação? Quão grande deve ser um planeta para obter a proteção de um campo magnético, como o da Terra, e sustentar um clima habitável?


Para entender o que aconteceu e como Marte evoluiu, precisamos compreender o planeta hoje. Essas questões sobre a atmosfera, a água e o núcleo de Marte motivaram várias missões de grande destaque. Enquanto os rovers da NASA, como o Spirit, Opportunity, Curiosity e Perseverance estudaram a mineralogia da superfície, o Trace Gas Orbiter da ESA analisa o ciclo da água, a espaçonave Maven da NASA estuda a perda atmosférica para o espaço, e o módulo InSight foi enviado para investigar a atividade sísmica.


Em 2021, Simon Stähler, do ETH Zurich, na Suíça, e colegas publicaram um artigo com dados da missão InSight. Nele, apresentaram uma análise da forma como as ondas sísmicas atravessam Marte, desde terremotos próximos à InSight, passando pelo manto, pelo núcleo, refletindo do outro lado do planeta e voltando à sonda.


Eles detectaram evidências do núcleo pela primeira vez e conseguiram estimar seu tamanho e densidade. Modelaram um núcleo com uma única camada líquida, maior e menos densa do que o esperado, e sem núcleo interno sólido. O tamanho era enorme, cerca de metade do raio de Marte, cerca de 1.800 km, e a baixa densidade implicava que era composto por muitos elementos leves. Esses elementos, como carbono, enxofre e hidrogênio, alteram a temperatura de fusão do núcleo e afetam como ele poderia cristalizar ao longo do tempo, tornando mais provável que permanecesse líquido.


O núcleo interno sólido, com 610 km de raio, encontrado por Huixing Bi e colegas, é extremamente significativo. A própria presença de um núcleo sólido mostra que cristalização e solidificação estão ocorrendo à medida que o planeta esfria.


A estrutura do núcleo é mais parecida com a da Terra e, portanto, mais provável de ter produzido um dínamo em algum momento. Na Terra, são as mudanças térmicas entre o núcleo interno sólido, a camada líquida e o manto que impulsionam a convecção na camada líquida e criam o dínamo que gera o campo magnético. Esse resultado aumenta a probabilidade de que Marte tenha tido um dínamo no passado.


Com Simon Stähler e coautores relatando um núcleo totalmente líquido e Huixing Bi e colegas relatando um núcleo interno sólido, pode parecer que há controvérsia. Mas não é o caso. Este é um excelente exemplo de progresso na coleta e análise de dados científicos.



Modelos concorrentes de Marte


A InSight pousou em novembro de 2018 e seu último contato com a Terra ocorreu em dezembro de 2022. Com a publicação de Stähler em 2021, havia novos dados da InSight a serem examinados. O modelo de Stähler foi revisado em 2023 por Henri Samuel, da Université Paris Cité, e colegas. Um tamanho e densidade revisados do núcleo ajudaram a reconciliar os resultados da InSight com outras evidências.


No artigo de Stähler, um núcleo interno sólido não foi especificamente descartado. Os autores afirmam que a intensidade do sinal dos dados analisados não era forte o suficiente para identificar ondas sísmicas cruzando uma fronteira de núcleo interno. Foi uma primeira medição com alto grau de qualidade do núcleo de Marte, mas deixou em aberto a questão de camadas adicionais e estrutura.


No estudo mais recente publicado na Nature, os cientistas alcançaram o resultado por meio de uma seleção cuidadosa de tipos específicos de eventos sísmicos, a uma certa distância da InSight. Eles também empregaram novas técnicas de análise de dados para extrair um sinal fraco do ruído dos instrumentos.


Esse resultado certamente terá impacto na comunidade científica, e será muito interessante ver se novas reanálises dos dados da InSight apoiarão ou rejeitarão o modelo. Uma discussão aprofundada do contexto geológico mais amplo e se o modelo se ajusta a outros dados disponíveis que restringem o tamanho e a densidade do núcleo, também deverá vir em seguida.


Compreender a estrutura interna dos planetas em nosso sistema solar é fundamental para desenvolver ideias sobre como eles se formam, crescem e evoluem. Antes da InSight, modelos para Marte semelhantes aos da Terra eram investigados, mas certamente não eram os mais aceitos.



Artigo encontrado no site da agência de divulgação científica estadunidense Phys.org  (originalmente publicado em 07/09/2025)

 
 
 

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